quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

Pessoas satélites

- W3 sul, tem lugar pra ir sentado, tá vazio!
_ Vai, rodoviária, (suja, ordinária).
 Corre para o eixinho,
Pega, pede implora para o cobrador da lotação um cantinho,
Você se abaixa na barreira.
Vai, pega o baú, a combinha, a carona, pede carona.
Vai se embora, suma daqui!
Vai pra casa, vai pra cama, e dorme, dorme em paz,
E se possível não volte mais.
Porque aqui ninguém te quer.
Você é feio, você é pobre, você precisa.
Você não combina com a mansão do Lago Sul,
Você é preto, você é índio, você é nordestino.
Você trabalha você não descansa, você acorda cedo, você mora longe...
Vai-se embora, não volte.
Brasília não te quer,
Te escorraça todo dia.
E ainda assim você a lambe nos pés...
Brasília te humilha te ignora, e você ainda torce por ela,
Ainda vota pelo asfalto em frente ao seu portão
Ainda põe o nome na lista da cesta básica
Ainda acredita que o teu filho fará direito na UNB.
Você estuda pra concurso público, perde o domingo tendo fé.
E ainda torce para que o vizinho também passe,
E quando não encontra o nome na lista dos aprovados, pensa que estudou pouco,
Que da próxima vez chega lá.
Mas você não vai,
Ninguém te quer estudado, ninguém te quer seguro,
Ninguém quer que o teu filho tenha futuro.
Ninguém te quer aqui,
Brasília nunca foi teu lar, nunca te deu nada,
E tirou tanto de você...
Tirou sua juventude, o brilho dos teus olhos, a cor dos teus cabelos...
Não vê que você não cabe em Brasília?
A tua fé não serve pra nada nessa terra,
O teu Deus não vai te alcançar...
Vai embora antes que a tua dor vire ódio,
Antes que você perca o pouco que te resta,
Vai, enquanto você ainda tem pernas...
Depois?
Depois a miséria só cresce, toma conta do corpo,
Quando ela passa estampada na frente dos nossos olhos
A gente segura mais forte a bolsa, abaixa a cabeça, quase corre...
Fuja dessa tristeza de cidade grande, dessa frieza de cidade fabricada,
Porque você persiste nessa tentativa inútil de aceitação?
A tua miséria não combina com a noite do plano piloto,
Depois das 19h ninguém quer ver a tua cara de cansaço
Vai embora
Deita o teu rosto triste no colo que te cabe,
E deixa que o tempo passe,
Não adianta nada,
Brasília é uma cidade amargurada.
O mundo é.
E já desistiu de ti.